You are currently viewing Teologia da Libertação levou Leonardo Boff a se sentar na mesma cadeira da Inquisição ocupada por Galileu Galilei

Teologia da Libertação levou Leonardo Boff a se sentar na mesma cadeira da Inquisição ocupada por Galileu Galilei

  • Post category:Notícias

“A Teologia me levou a sentar na cadeirinha de Galileu Galilei”, disse Leonardo Boff ao lembrar o processo que sofreu no Vaticano 

“Aqui (no lixão de Petrópolis) começa a teologia da libertação junto com os porcos e urubus catando lixo para sobreviver. Perverso capitalismo que tolera milhões passando fome e vivendo nos lixões.” Leonardo Boff

Por Marcia Maria Cruz

A escritora Eliana Alves Cruz iniciou a conversa com o escritor e teólogo Leonardo Boff, no primeiro dia do Flipetrópolis, fazendo uma audiodescrição: “sou mulher negra e com dreads no cabelo”. Em seguida apresentou o escritor como um “ícone” e pediu que também ele fizesse sua audiodescrição: “Fiz uma viagem longa para chegar até aqui. Sai lá da Lapônia. Sou o irmão do Papai Noel”. O tom de brincadeira na apresentação revela que a semelhança entre o bom velhinho e Boff não são apenas os cabelos e barbas brancos. Tal qual Santa Claus, Boff presenteia  a plateia ao falar da Teologia da Libertação, da Mãe Terra e da opção radical de se colocar na trincheira, ao lado dos pobres e contra toda forma de opressão.

Boff elogiou Eliana, lembrando que a autora vencedora do Prêmio Jabuti resgata em sua obra “memórias perigosas dos que foram trazidos de África e aqui foram escravizados”. Eliana agradeceu, mas brincou que cabia a ela a tarefa de apresentar Boff. “Ícone por conta da coragem, por conta da fé inabalável, por conta dos 127 livros escritos e por ser um farol para um País que, volta e meia, tem um flerte com o autoritarismo, e com a crueldade do silenciamento. É uma voz insurgente contra tudo isso”, definiu Eliana.

Eliana retomou a obra “Igreja, carisma e poder”, escrita na década de 1980, que levou Joseph Ratzinger a conduzir, na Igreja Católica Romana, um processo que impôs a Boff um “silêncio obsequioso”, ou seja, um silenciamento como teólogo. Boff remonta às origens da teoria da libertação ao contar o tempo que viveu em Manaus depois de voltar da Alemanha. “Como pregar a ressurreição de Cristo aos povos indígenas que estão sendo mortos e exterminados.” E concluiu: “minha teologia, por melhor que fosse, não era adequada a eles”.

Em Manaus, Boff se viu diante de uma realidade que não podia ser apreendida pela teologia que aprendeu na Europa, que não era adequada à realidade latino-americana.  Boff também lembrou do enfrentamento à ditadura militar, período em que escreveu o livro “Jesus Cristo libertador”. “A polícia veio logo em cima, mas procuravam Genézio Darci Boff”, disse que Leonardo é nome religioso que adotou ao entrar na ordem religiosa franciscana. 

Boff relembrou o processo no Vaticano. “A Teologia me levou a sentar na cadeirinha de Galileu Galilei”, disse ao lembrar o processo que passou no Vaticano quando foi interrogado por Ratzinger no “edifício da Inquisição”. A primeira pergunta feita a ele: “você crê que Jesus é Deus? Não, senhor, Jesus é o filho de Deus”, respondeu.

O escritor também rememorou os mais de 20 anos em que trabalhou no “lixão” de Petrópolis. “Aqui (no lixão) começa a teologia da libertação junto com os porcos e urubus catando lixo para sobreviver.  Perverso capitalismo que tolera milhões passando fome e vivendo nos lixões”, refletiu à época..

Boff contou um pouco da sua relação com três papas: João Paulo II, Bento XVI e Francisco. As reflexões sobre meio ambiente tiveram início depois de receber uma carta de João Paulo II, que pedia que ele demonstrasse que se tornou uma “pessoa séria” e que estudasse os problemas importantes da igreja. Respondeu ao pontífice que os problemas que realmente mereciam a sua atenção eram os problemas da Terra. 

Em 1984, começou com a ecologia que dialoga com a teologia da libertação. “Teologia da Libertação é a única teologia que dá conta das ameaças que a humanidade está correndo. É uma teologia extremamente viva.” Boff ressaltou que o termo libertação muitas vezes desagrada, por ser exatamente o contrário da opressão, da mesma forma que o contrário da pobreza é a justiça social. Boff contou da boa relação com o Papa Francisco, o que permitiu até que o argentino enviasse uma foto antiga em que estavam tanto o pontífice quanto Boff. 

Boff falou da disputa para que o documento “A carta da Terra” fosse denominada de “Carta da Mãe Terra”. Na época, Michail Gorbachev que, como chefe de estado, se autodenominava ateu; no âmbito privado, entretanto, foi criado pela avó e foi um ortodoxo devoto. Gorbachev defendia a necessidade de uma nova espiritualidade, espiritualidade da Terra, com novos valores e princípios.  “A grande crise de hoje é a crise do espírito, o que há de mais profundo em nós.  É no espírito onde habita Deus”, afirmou. Boff se emocionou ao encerrar falando de amor.

Sobre o Flipetrópolis

A primeira edição do Flipetrópolis foi viabilizada pela Prefeitura de Petrópolis, o patrocínio do Grupo Águas do Brasil e o apoio cultural do Itaú e da GE Aerospace, via Lei Rouanet do Ministério da Cultura. Todas as atividades realizadas dentro do Flipetrópolis são gratuitas. Com a curadoria de Afonso Borges, Sérgio Abranches, Tom Farias, Gustavo Grandinetti e Leandro Garcia, acontece entre os dias 1.º e 5 de maio de 2024, no Palácio de Cristal.

Serviço:

Festival Literário Internacional de Petrópolis – Flipetrópolis
De 1.º a 5 de maio de 2024, de quarta-feira a domingo
Local: Palácio de Cristal – R. Alfredo Pachá, s/n – Centro, Petrópolis / Programação Digital – YouTube, Instagram e Facebook – @flipetropolis
www.flipetropolis.com.br
Entrada gratuita